Por Odir Cunha, do Centro de Memória
Desde o Campeonato Paulista de 1984 o torcedor santista não sabia o que era sentir a alma lavada por um título. No Paulista de 1986 o time ganhou o primeiro turno, mas foi eliminado nas semifinais com duas derrotas para a Internacional de Limeira. Em 1995 o título brasileiro só não veio porque vossa senhoria, o árbitro Márcio Rezende de Freitas, não quis. Mas naquela noite de 6 de fevereiro de 1997, uma quinta-feira em que o Maracanã foi tomado por torcedores adversários, o título do Torneio Rio-São Paulo haveria de ser nosso.
A competição, que era organizada pelas federações dos dois Estados e reunia os clubes cariocas e paulistas mais tradicionais, fora relançada em 1993, depois de uma interrupção de 27 anos. Não foi disputada em 1994, 1995 e 1996, mas voltou no início de 1997, em formato de confrontos eliminatórios a partir das quartas-de-final. Ao Santos coube uma prova de fogo logo na estreia, pois o sorteio lhe indicou o Vasco, vice-campeão carioca de 1996, que seria campeão brasileiro em 1997.
No Morumbi, na noite de 21 de janeiro, terça-feira, o Alvinegro Praiano vencia por 2 a 1 até os 40 minutos da segunda etapa, quando o Vasco empatou se valendo de uma regra especial do torneio que transformava a décima-quinta falta de uma equipe em tiro livre direto para a outra. Carlinhos e Vágner marcaram para o Santos; Ramon fez os dois vascaínos.
Cinco dias depois, sábado, em São Januário, o Santos teve de ser corajoso e confiante para superar o adversário e a arbitragem. Anderson Lima foi expulso e o Vasco fez mais dois gols de bola parada. Após um empate de 3 a 3, a disputa foi para os pênaltis, em que Zetti defendeu uma cobrança e Dutra sacramentou a classificação santista com um chute de canhota no ângulo direito de Carlos Germano.
Em seguida, o Santos foi ao Parque Antártica enfrentar o Palmeiras, campeão paulista de 1996. No papel, o adversário era favorito, mas o Alvinegro Praiano, usando vistosos calções estrelados, jogou com rara desenvoltura e venceu por 3 a 1. Djalminha, cobrando falta, marcou para o time da casa aos 25 minutos, mas Baiano empatou ainda no primeiro tempo e, no finalzinho do jogo, Marcos Assunção e Robert abriram a boa vantagem de 3 3 a 1 para o Santos.
No jogo de volta, em Presidente Prudente, o Palmeiras venceu por 1 a 0, gol de Ronaldão, contra, mas o Santos se classificou pelo saldo de gols. Seu adversário na decisão seria o Flamengo, que, para chegar à decisão, passara por Corinthians e São Paulo.
Um golaço para calar 70 mil pessoas
Treinado pelo ídolo rubro-negro Júnior, o Flamengo, campeão carioca de 1996, foi montado pelo presidente Kléber Leite para ganhar tudo em 1997. Naquela final, o forte do time era a dupla ofensiva Romário e Sávio. Mas o Santos, orientado por Vanderlei Luxemburgo, era uma equipe mais entrosada e mostrou isso no primeiro jogo, na noite de 4 de fevereiro, no Morumbi.
Alessandro, em ótima fase, marcou aos seis minutos e Macedo ampliou aos 29 do primeiro tempo. Só aos 40 minutos do segundo tempo é que Marcelo Ribeiro diminuiu para o time carioca. A vitória por 2 a 1 dava ao Santos a vantagem de jogar pelo empate a partida decisiva, dois dias depois, no Maracanã, mas o triunfo do rubro-negro, por qualquer contagem, deixaria a taça no Rio de Janeiro.
Eufóricos com as perspectivas de um título logo no início do ano, os torcedores do Flamengo compareceram em massa ao Maracanã, que atingiu o público de 70.729 espectadores. Junior escalou seu time com Zé Carlos, Fábio Baiano, Júnior Baiano, Fabiano e Gilberto (depois Leonardo); Moacir, Bruno Quadros (Iranildo), Lúcio (Márcio Costa) e Nélio; Romário e Sávio.
Luxemburgo armou o Santos com Zetti, Anderson Lima (depois Baiano), Sandro, Ronaldão e Rogério Seves (Juari); Marcos Assunção, Vágner, Alexandre (Caíco) e Piá; Macedo e Alessandro. Para a arbitragem foi escolhido o paulista Oscar Godói.
Melhor desde o início, o Alvinegro abriu o marcador aos 33 minutos, com Anderson Lima cobrando falta de longa distância no canto direito de Zé Carlos. Mas a equipe recuou no final da primeira etapa e Sávio e Romário fizeram jus à fama. Aos 37 minutos Sávio foi derrubado na área por Ronaldão. Romário bateu o pênalti e empatou o jogo. Oito minutos depois, Sávio driblou pelo ponta esquerda, foi à linha de fundo e cruzou rasteiro para Romário esticar o pé e jogar a bola no fundo das redes de Zetti.
A desvantagem de 2 a 1 obrigou o Santos a buscar o empate na segunda etapa, mas as chances só começaram a surgir quando o adversário, aparentemente cansado, preferiu recuar e esperar pelas oportunidades de contra-ataque. Com a iniciativa, o Alvinegro passou a rondar a área rubro-negra.
Aos 32 minutos, após mais um escanteio, pela esquerda, a rebatida da defesa encontrou Juari livre de marcação. Ele matou a bola e a deixou ficar à sua frente. Preparou-se como se fosse cobrar uma falta e encheu o pé, de esquerda. O chute, como o torcedor diz, “pegou na veia”. A bomba explodiu no travessão, próxima ao ângulo direito da meta de Zé Carlos, e caiu dentro do gol.
Os jogadores correram para comemorar junto ao técnico Luxemburgo e os companheiros no banco de reservas. Ainda haveria mais 15 minutos de jogo, mas nada parecia poder tirar aquele título do Santos, a quinta conquista do Alvinegro Praiano em uma das competições de melhor nível técnico disputadas no País. O título do Rio-São Paulo de 1997 veio se somar aos de 1959, 1963, 1964 e 1966, que tornaram o Santos a equipe mais vezes campeã do torneio.