Por Guilherme Guarche, do Centro de Memória
O pujante Estado de São Paulo possui 645 municípios e um dos menores é o de Santa Mercedes, com menos de três mil habitantes, localizado próximo ao Rio Paraná, na região Noroeste do Estado, a 686 quilômetros da capital paulista. A diminuta cidade interiorana, fundada em 1948, tornou-se conhecida dos esportistas brasileiros por ser a terra natal de Renato Dirnei Florêncio Santos, que veio ao mundo numa terça-feira, 15 de maio de 1979.
Renato, ou Renatinho, como era chamado quando iniciou sua carreira nas categorias de base do Guarani, em 1994, foi um dos mais destacados camisas oito que o Santos teve neste século XXI. O meio-campista, ou segundo volante, foi contratado pelo Alvinegro Praiano quando o time era dirigido pelo técnico Giba. Sua estreia ocorreu em Sorocaba, em 29 de julho de 2000, sábado, em um amistoso sem gols com o São Bento.
O jovem, na época com 20 anos e 1,77m de altura, teve uma ascensão rápida no time. Ganhou a confiança e a admiração dos dirigentes e dos torcedores santistas pelo seu estilo de jogar esforçado, e ao mesmo tempo clássico, e também por liderar o grupo de jogadores novatos, entre eles Robinho e Diego, dos quais tornou-se amigo e conselheiro devido ao seu comportamento simples e sincero.
O primeiro título. Inesquecível
Dois anos depois de sua chegada à Vila Belmiro, participou ativamente da memorável conquista do sétimo título brasileiro pelo time santista, após o clube da Vila amargar um longo jejum de 18 anos sem uma conquista importante. Ele foi um dos destaques da desacreditada equipe, comandada pelo técnico Leão, que ficou conhecida como mais uma geração vitoriosa dos “Meninos da Vila”.
Nessa campanha, Renato participou de todas as 31 partidas da competição, não recebendo nenhum cartão, nem vermelho, nem amarelo, mesmo jogando na frente da defesa, como segundo volante. Eficiente na marcação e nos desarmes, também ajudou o ataque e fez três gols de grande valia, um deles decisivo, marcado aos 43 minutos do segundo tempo da primeira partida da decisão, decretando a vitória por 2 a 0 sobre o arquirrival paulistano.
No ano seguinte suas boas atuações o levaram a defender a Seleção Brasileira, e nesse ano foi agraciado com o cobiçado troféu Bola de Prata, ofertado pela revista Placar. No Escrete nacional sagrou-se campeão da Copa América em 2004 e da Copa das Federações em 2005.
O discreto camisa oito jogou algumas partidas na campanha vitoriosa que deu ao Peixe o seu oitavo título brasileiro, em 2004, ano em que seu futebol estava sendo monitorado por grandes equipes da Europa. Assim, aquilo que o torcedor santista não desejava, naquele mesmo ano acabou se tornando uma realidade, pois Renato foi negociado com a equipe do Sevilla FC, da Espanha.
Ídolo Rojiblanco
Na Península Ibérica Renato escreveu uma história vitoriosa. Tornou-se ídolo da fanática torcida rojiblanca por ser um segundo volante requintado, com um futebol vistoso, que ajudou a equipe espanhola a conquistar importantes títulos, como a Copa da Uefa e a Copa do Rei em 2006/07, repetindo a façanha em 2009/10, além da Supercopa Europeia em 2006/07. Ao atingir, em primeiro de março de 2011, a marca de 279 partidas disputadas pelo Sevilla, tornou-se o jogador estrangeiro com o maior número de participações pelo centenário clube espanhol.
O retorno ao Brasil
Sem condições físicas ideais devido ao passar dos anos, seu sucesso na Espanha foi diminuindo e ele sentiu que era o momento de voltar ao Brasil. Em maio de 2011 assinou contrato com o Botafogo carioca, que defendeu por três anos, ganhando a Taça Rio em 2012, e também em 2013, quando ganhou a Taça Guanabara e o Campeonato Carioca no mesmo ano.
Suas atuações discretas no clube da Estrela Solitária fizeram com que a torcida botafoguense não mais desejasse sua presença na equipe, e ele então assinou contrato com o Alvinegro da Vila Belmiro, voltando ao Peixe no dia 13 de maio de 2014, dez depois de ter ido para a Europa.
Nessa segunda passagem no Santos ele conquistou, no ano seguinte, o título de campeão paulista, jogando ao lado de seus antigos companheiros Robinho e Elano. Em 2016 sagrou-se bicampeão paulista ao lado de Ricardo Oliveira. No Campeonato Brasileiro, Renato atuou em todas as 38 partidas, sendo o único jogador santista a realizar tal feito.
Outro motivo de estar bem vivo na lembrança dos adeptos do Peixe, é que em seu último ano defendendo o time praiano ele se tornou o jogador santista com mais idade a marcar um gol no campeonato nacional. O feito ocorreu em 3 de junho de 2018, na goleada por 5 a 2 sobre o Vitória, na Vila Belmiro. Aos 39 anos e 20 dias Renato marcou o quarto gol do Santos aos 44 minutos do primeiro tempo.
A despedida no Templo Sagrado do Futebol
Na noite de sábado, 24 de novembro de 2018, o atleta mercedense dizia adeus em definitivo à sua carreira de futebolista em partida diante do CA Mineiro, na Vila Belmiro, pelo Campeonato Brasileiro. Sob o comando do técnico Alex Stival, o Cuca, o Santos venceu por 3 a 2 formando com Vanderlei, Victor Ferraz, Luiz Felipe, Gustavo Henrique e Dodô, Alison, Carlos Sanchez e Diego Pituca, Gabriel (Renato), Derlis Gonzalez (Copete) e Felippe Cardoso (Rodrygo). Os gols santistas foram Carlos Sánchez, Felippe Cardoso e Gabriel.
Nessa despedida, repleta de emoções para o requintado craque, o time santista e a comissão técnica adentraram no gramado vestindo camisetas que simulavam ternos, em alusão à sua elegância jogando bola. Em seguida, no telão do estádio, ex jogadores e também seus familiares deram depoimentos sobre o homenageado, que não segurou a forte emoção vivida naquele momento.
A nota dissonante na noite festiva foi a ausência do torcedor nas arquibancadas do Urbano Caldeira, pois apenas 4.591 pessoas testemunharam a partida que classificou o Santos para a Copa Sul-americana do ano seguinte. Ao todo, em suas duas passagens pelo Santos, Renato jogou 424 partidas e marcou 33 gols. Ele é o quarto jogador que mais vestiu a camisa do time de Vila Belmiro.
Um dirigente discreto
Ao deixar a vida de atleta Renato tornou-se um dos homens de confiança do presidente santista José Carlos Peres, que o nomeou gerente de futebol do clube. Avesso à promoção pessoal, o grande meia dá poucas entrevistas e leva uma vida discreta. Como inúmeros ex jogadores santistas, também escolheu a cidade de Santos para morar.
Ele reside na orla praiana, no charmoso bairro do Gonzaga, por coincidência no mesmo prédio onde também mora o zagueiro artilheiro Alex, uma das torres-gêmeas, que com ele formou no time campeão brasileiro de 2002 e 2004.