Os franceses pensavam que o Santos era a Seleção Brasileira

Guilherme Guarche, Centro de Memória

No ano de 1930, a praça de esportes do Santos, que ainda não tinha o nome de Estádio Urbano Caldeira recebeu do jornalista Antônio Guenaga do jornal “A Tribuna”, o apelido de “Alçapão” devido a campanha feita nesse ano com 25 partidas disputadas não sofrendo nenhum revés e obtendo 21 vitórias e 4 empates.

E no dia 30 de julho desse distante ano, uma quarta-feira, a Seleção da França, que era chamada de “Diabos Azuis”, após disputar a primeira Copa do Mundo de Futebol, vindo do Uruguai retornava à Europa a bordo do navio S.S. Duílio, fez uma escala no porto de Santos e aceitou o convite do Santos para a realização de um amistoso no campo santista no bairro da Vila Belmiro, e foi derrotada pelo placar de 6 a 1.

A tripulação do navio ficou aguardando no porto santista seus principais passageiros jogarem a primeira partida deles em solo brasileiro, no período vespertino já que o campo do Alvinegro não possuía iluminação artificial.

Nesse jogo que marcaria um dos grandes momentos da história santista, o então prefeito de Santos, José de Souza Dantas, determinou que o expediente no comércio local se encerrasse às 14 horas, para que todos os torcedores, não só do Litoral, mas de todo o Estado, pudessem assistir à esperada partida entre a seleção europeia e o time que nos últimos três anos havia obtido o vice-campeonato estadual.

O Santos era conhecido em todo o Brasil como “O time do ataque dos 100 gols”, devido à memorável campanha de 1927, em que o ataque praiano detonava as equipes adversárias com placares elásticos, e só não ganhou o campeonato regional por ter sido prejudicado pela arbitragem no jogo final contra o Palestra Itália, em que perdeu por 3 a 2.

O Alvinegro Praiano tinha mantido a base do time desde então, com Athié no gol, Aristides e Meira na zaga; Osvaldo, Roberto e Alfredo na ligação com o meio campo; e no ataque Omar, Camarão, Mário Seixas, Feitiço e Evangelista.

O técnico era o conceituado uruguaio Ramon Platero, que treinou os times cariocas Vasco da Gama e Flamengo. Ele fora também treinador da Seleção Brasileira de Futebol em 1925.

A única ausência no time santista era a de Araken Patusca, que deixara a Vila Belmiro no início do ano para dar seu lugar ao baiano Mário Seixas. Araken, no entanto, participara da Copa disputada no Uruguai inscrito pela Confederação Brasileira de Futebol.

Um dos nomes mais comentados nas conversas entre os torcedores era o do jogador Lucien Laurent, autor do primeiro gol na Copa do Mundo, na partida em que os franceses venceram o México por 4 a 1. Esse feito só foi reconhecido pela FIFA no ano de 1970.

As arquibancadas de madeira da praça de esportes do clube santista, no bairro da Vila Belmiro, ficaram apinhadas de entusiasmados torcedores que queriam testemunhar um acontecimento marcante para o futebol nacional.

Feitiço marcou quatro gols e Mário Seixas dois gols. O Peixe entrou em campo com Athié Aristides e Meira; Osvaldo, Roberto e Alfredo; Omar, Camarão, Feitiço, Mario Seixas e Evangelista.

Os franceses, terminado o jogo, não acreditavam que tinham enfrentado o Santos. O chefe da delegação francesa protestava: “Isso uma desonestidade! Os senhores nos convidam para enfrentar o Santos, e colocam à nossa frente a Seleção do Brasil.”

Foi necessário que o presidente Guilherme Gonçalves levasse os incrédulos adversários à sede do clube na Rua Itororó, 27, para mostrar as fichas com as fotos dos jogadores do Alvinegro Praiano.

Lucien Laurent, o autor do gol histórico serviu no exército francês durante a Segunda Guerra Mundial, sendo, inclusive, capturado e enviado por nazistas a campos de trabalhos forçados só retornando ao seu país em 1943, já seu colega de equipe e capitão dos “Diabos Azuis”, Alexandre Villaplane foi condenado e fuzilado no ano de 1945, pois foi considerado um traidor da pátria por ter sido acusado de colaborar com os nazistas.

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