O primeiro Paulista a gente nunca esquece

Por Pedro Mendes, do Memorial das Conquistas

Há exatos 87 anos, num mesmo 17 de novembro, o Santos sagrava-se campeão paulista pela primeira vez após vencer o rival Corinthians no estádio Alfredo Schring, o popular Parque São Jorge.

Após algumas frustrações em anos anteriores, quando bateu na trave de formas inacreditáveis, mesmo tendo a melhor equipe, o Peixe almejava o título paulista como pouco se almejou algo na história, e nesse ano de 1935, lavou a alma e venceu o maior rival na partida decisiva.

Dois Campeonatos Paulistas

Em 1935, o futebol vivia os primeiros anos do profissionalismo e algumas divergências políticas e de ideais pautavam o futebol da época. Dois campeonatos ocorreram, a Liga Paulista de Futebol, vencida pelo Santos e que contava com os clubes que se tornaram rivais do Peixe ao longo da história, como Corinthians e Palmeiras (na época Palestra Itália), e a Liga da APEA (Associação Paulista de Esportes Atléticos), que deixou de existir após organizar seu Campeonato Paulista de 1936.

A Campanha

A competição deste ano foi disputada no formato de pontos corridos, com dois turnos com partidas de ida e volta. Como contava com sete clubes, o Peixe disputou seis jogos em cada turno até chegar a última rodada com chances de título.

Na estreia do campeonato, o Santos enfrentou o Palestra Itália (atual Palmeiras). A vitória sobre o atual campeão paulista, um dos favoritos ao título, animou a equipe e o Alvinegro venceu os dois desafios seguintes, contra o Hespanha (atual Jabaquara) e o Paulista, da capital. 

Nem a derrota para o Corinthians na quarta rodada abalou os jogadores, que venceram os dois últimos desafios do primeiro turno, enfrentando a Portuguesa Santista e o Juventus.

Já no segundo turno, o Peixe se manteve invicto até a última e decisiva rodada, venceu três partidas e empatou duas, precisando apenas do empate contra o Corinthians fora de casa. O rival do Santos não tinha mais chances de título, mas jogava em casa e era a única equipe que havia vencido o Peixe na competição.

O Jogo Decisivo

Naquela tarde de domingo, incentivado pelos torcedores que subiram a serra de trem, o Santos jogou com Cyro, Neves e Agostinho; Ferreira, Marteletti e Jango; Saci, Mário Pereira, Raul, Araken e Junqueirinha. O técnico era Virgílio Pinto de Oliveira, o Bilu.

Mesmo sem chances de conquistar o campeonato, o Corinthians iniciou a partida com a disposição de um finalista. O Santos reagiu rápido e equilibrou o jogo. As duas equipes passaram a alternar ataques perigosos, até que, aos 36 minutos, o Peixe abriu o marcador com Raul. O atacante recebeu a bola de Araken, livrou-se da marcação e marcou, para delírio dos torcedores santistas.

Na etapa final, o Santos ampliou a vantagem. Mário Pereira cruzou na área, Raul e Jaú disputaram o lance pelo alto, a bola foi desviada e parou nos pés de Araken. O artilheiro santista acertou um chute à meia altura e marcou um bonito gol.

O Corinthians não se entregava. O goleiro Cyro precisou fazer grandes defesas até os últimos instantes, quando o árbitro Heitor Marcelino Domingues apitou o final do jogo e garantiu a vitória para o time da Vila Belmiro.

O título deu ao Santos a Taça Capitão F. Guedes, ofertada pela Liga Paulista de Futebol, que promovia o seu primeiro campeonato no Estado. Hoje essa taça está exposta no Memorial das Conquistas, no estádio Urbano Caldeira.

Para ganhar o primeiro de uma série de 22 títulos estaduais conquistados até hoje, o Peixe disputou 12 partidas, venceu nove, empatou duas e perdeu apenas uma. A equipe marcou 32 e sofreu 12 gols.

Jogo limpo, ou fogo no Parque São Jorge

Segundo entrevista do meia-atacante Mário Pereira, o “Perigo Loiro”, caso o time santista fosse prejudicado pela arbitragem, como aconteceu na partida final do Campeonato de 1927, a torcida do Santos incendiaria o Estádio do Parque São Jorge.

Por orientação do presidente do Santos, Carlos de Barros, estivadores do Porto levaram galões de gasolina em vagões da São Paulo Railway alugados para conduzir a torcida santista para o jogo. Se a arbitragem de Heitor Marcelino Domingues prejudicasse acintosamente o Santos, os estivadores, colocariam fogo nas arquibancadas de madeira do estádio. Mas não foi preciso apelar para atitude tão extrema. O Santos jogou melhor e ganhou com autoridade, por 2 a 0. 

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