Por Odir Cunha, do Centro de Memória
Para o santista eleger um jogador como ídolo, não basta que ele jogue muito bem, mesmo magnificamente bem. Ele precisa amar o Santos de verdade. Quando Neymar da Silva Santos Júnior, o garoto de 17 anos nascido em Mogi das Cruzes em 5 de fevereiro de 1992, finalmente estreou no time profissional do Santos, o torcedor já sentia imensa simpatia por ele.
Desde as categorias de base sua habilidade era comentada. Ao substituir o colombiano Molina aos 15 minutos do segundo tempo da amarrada partida contra o Oeste de Itápolis, seu corpo magro, onde sambava um uniforme branco com o número 18 às costas, atraiu os olhares dos 23.590 torcedores presentes ao Pacaembu.
Um minuto depois de entrar em campo, Neymar, aberto pela direita, recebeu passe curto de Madson. Confiante, como só os veteranos e os craques sabem ser, nem olhou para o lado e foi pra cima do marcador. Gingou para a esquerda, saiu liso pela direita e cruzou de curva, de fora para dentro, encobrindo o goleiro Weverton.
A bola bateu no travessão e quicou na área pequena, em um momento que assustou o adversário e animou os santistas. Em exatos quatro segundos Neymar mostrou que, mais do que craque, poderia ser o redentor pelo qual os santistas, novos e velhos, ansiavam desde que Pelé parou.
Oito dias depois, no mesmo Pacaembu, o Santos já vencia o Mogi Mirim por 2 a 0 quando, aos 28 minutos do segundo tempo, Roni penetrou pela esquerda da grande área e cruzou à meia altura. Neymar mergulhou e, de cabeça, fez o seu primeiro gol como profissional. Na comemoração, socou o ar, como Pelé, e ergueu as duas mãos para o céu. Instantes depois o estádio passou a gritar o seu nome. O casamento dos santistas e Neymar estava consagrado.
Dois títulos por ano
Em 2009 o Santos foi vice-campeão paulista, mas no primeiro semestre de 2010 já deu para percebeu que a magia tinha voltado à Vila mais famosa do mundo. Neymar, Paulo Henrique Ganso e Robinho, coadjuvados por Wesley, André e Madson formaram a linha ofensiva mais criativa e temida do continente. Campeão da Copa do Brasil e do Campeonato Paulista em 2010, em 2011 o Alvinegro Praiano venceria novamente o Paulista e, após 48 anos, voltaria a triunfar na Copa Libertadores. Em 2012, último ano de Neymar na Vila, viriam o tricampeonato paulista e o título da Recopa Sul-americana. Cada jogo do Santos trazia a perspectiva de mais um show.
Talentoso e irreverente, Neymar era o grande astro da trupe. Capaz de inventar dribles a cada jogo, o menino, que agora vestia a honorável camisa 10, passeava em campo com liberdade para criar. Às vezes tentava uma, duas vezes, e nada acontecia. Em outras, driblava todo mundo e fazia o gol do jeito que queria. Ambidestro, passava, chutava – e driblava – com os dois pés, o que é sempre complica a tarefa do marcador. Com 1,75 e sem grande impulsão, só não se destacava pelas cabeçadas.
Fez vários gols que mereciam uma placa: contra Internacional, Atlético Mineiro, Santo André… e recebeu da Fifa o Prêmio Puskás pelo gol mais bonito de 2011, na Vila Belmiro, depois de driblar toda a defesa do Flamengo – em jogo épico que terminou 5 a 4 para os adversários.
Do Santos, Neymar se tornou também o astro da Seleção Brasileira, pela qual foi campeão da Copa das Confederações, em 2013, e medalha de ouro nos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016. Só não impediu o Escrete de passar o maior vexame de sua história, ao ser goleada pela Alemanha por 7 a 1, no Mineirão, pela semifinal da Copa de 2014. Machucado no jogo anterior, contra a Colômbia, não foi escalado contra os alemães.
Pena que não tenha se saído bem no seu jogo mais importante pelo Santos, a final do Mundial de Clubes da Fifa de 2011, em Yokohama, contra o favorito Barcelona. Na verdade, Neymar, Ganso, Borges, quase todo o time mal pegou na bola. A equipe catalã goleou por 4 a 0.
Em 2012, além de comandar o Santos no Tricampeonato Paulista, Neymar foi o artilheiro da competição, com 20 gols. Também se destacou na decisão da Recopa Sul-americana, no Pacaembu, marcando um dos gols da vitória por 2 a 0 sobre a Universidad de Chile treinada por Jorge Sampaoli.
Despediu-se do Santos em 26 de maio de 2013, na última partida do primeiro turno do Campeonato Brasileiro, contra o Flamengo. O mando era santista, mas foi vendido para Brasília e o Alvinegro penou para empatar sem gols diante de 63.501 torcedores, quase todos contrários. Nervoso, Neymar pouco fez.
Ao partir para o Barcelona o garoto de 21 anos deixava um legado importante para a história santista. Vestiu 230 vezes a camisa mais preciosa do futebol e com ela marcou 138 gols, que o colocam na 13ª posição entre os maiores artilheiros do clube, três gols a mais do que Odair e seis a menos do que Antoninho, ídolos do clube nas décadas de 1940 e 1950.
Carreira internacional
No Barcelona, Neymar formou com o argentino Lionel Messi e o uruguaio Luis Suárez o melhor ataque do mundo. Lá o Menino da Vila ganhou dois Campeonatos Espanhóis, três Copas do Rei, duas Supercopas da Espanha, uma Liga dos Campeões da Uefa, uma Supercopa da Uefa e, em 2015, o título Mundial de Clubes da Fifa.
Mas na Espanha, por mais espetaculares que fossem suas atuações, o público e a imprensa só viam Messi. Então, em agosto de 2017, numa decisão polêmica, Neymar aceitou trocar o Barcelona pelo Paris Saint-Germain, da França, que pagou os 222 milhões de euros da multa estipulada pelo clube espanhol. A transação milionária transformou o Menino da Vila, que na infância morava com os pais em um cômodo da casa da avó, na periferia de São Vicente, no jogador de futebol mais caro de todos os tempos.
Em Paris, maior estrela de uma equipe excelente, mas menos poderosa do que o Barcelona, Neymar conquistou apenas títulos nacionais: dois Campeonatos Franceses, uma Copa da França, uma Copa da Liga Francesa e a Supercopa da França.
Sua história ainda não terminou
Aos 28 anos, Neymar pode deixar uma marca ainda mais duradoura na história do futebol. Pode ser mais importante para a Seleção Brasileira, por exemplo. Mesmo com o bom retrospecto de 101 jogos e 61 gols pela Seleção, ainda não brilhou em uma Copa do Mundo, a competição que realmente eterniza os grandes craques.
Idolatrado por amantes do esporte de todo o mundo, particularmente por crianças e adolescentes que se encantam com sua habilidade, criatividade e ousadia, Neymar é motivo diário de milhões de visualizações no Youtube, a “tevê” mais assistida do planeta. Na maior parte desses vídeos, que reproduzem suas jogadas e gols inacreditáveis, o Menino da Vila veste a camisa do time que o descobriu e o consagrou. É uma forma indireta de, ainda hoje, quase sete anos depois de deixar a Vila Belmiro, divulgar o clube brasileiro mais conhecido no mundo.