[:pb]Por Gabriel Pierin, do Centro de Memória

Parecia uma quinta-feira qualquer na vida dos santistas. Como fazia todas as manhãs antes do trabalho, Harold Cross, um descendente de irlandeses, acordou e comprou o jornal Diário de Santos. Uma das notícias lhe chamou a atenção na seção de Sports.

Vários sportsmen desta cidade estão empenhados em organizar um poderoso club de football, tendo já para isso, conseguido um vasto e esplendido terreno de propriedade do sr. J.D. Martins, à rua Aguiar de Andrade, no Macuco, onde será instalado o ground da nova sociedade esportiva (…) No próximo domingo, às 2 horas da tarde, haverá uma reunião na sede do clube Concordia, para serem apresentadas as bases do novo clube, eleita a sua diretoria e tomadas outras deliberações atinentes aos fins da nova agremiação esportiva. Era já sensível a falta, entre nós, de um bom clube dedicado ao bello sport do football. Acreditamos que o novo clube venha preencher essa lacuna.

Harold ficou entusiasmado com a notícia. Ele era um dos precursores do futebol na cidade e notou que aquele grupo de jovens estava mesmo levando a sério a formação de um clube de futebol. Dias antes ele encontrara Raymundo, Argemiro e Mario Ferraz, da comissão organizadora, quando foi abordado tomando um café na rua Quinze.

O futebol precisava ressurgir na cidade. Harold ainda jogava no Clube dos Ingleses. Mas os sócios só disputavam peladas entre si, entre uma partida e outra de críquete. Ele decidiu que era necessário ajudar na formação de um novo clube e participar da fundação.

No anunciado dia 14 de abril de 1912, o clima na cidade estava bem agradável para o outono. Naquele domingo à tarde, Harold tomou o bonde até a Praça do Rosário. O Club Concórdia, local escolhido para a reunião, ficava bem próximo. Ele subiu os degraus do prédio e encontrou o amplo salão da sede do clube.

A quantidade de jovens lhe chamou atenção. “Alguns são meninos”, pensou. Era fato. Arnaldo Augusto Millon, filho do Capitão Millon, tinha apenas 15 anos. Seu irmão, Adolpho Millon Junior, 16. Outro Arnaldo, o Silveira, sobrinho de Sizino Patusca, era mais um jovem de 17 anos. Harold, no alto dos seus 27, sentiu-se um dos tios daquela garotada.

A intenção era mesmo montar um clube destinado ao futebol. Jovens, estudantes e esportistas eram a maioria. Aos poucos, o salão foi enchendo. Harold imaginou que já tivesse quase 40 pessoas quando Raymundo Marques tomou a palavra.

Ele explicou a situação do futebol na cidade, desde que o Internacional encerrou suas atividades e o Americano transferiu-se para a capital. As atenções se voltaram para Harold quando Raymundo, respeitosamente, apontou para sua direção, e fez considerações sobre sua trajetória desde a chegada do futebol na cidade. Harold ficou orgulhoso com a lembrança.

A seguir Raymundo disse que não pretendia concorrer à presidência. Ele entendia que a experiência lhe faltava. O rapaz disse ter conversado com Sizino Patusca e George Cox e sugeriu que a assembleia aceitasse as suas indicações para presidente e vice-presidente, respectivamente. Os presentes bateram palmas e aprovaram a proposição.

Num tom mais leve, Raymundo lembrou aos presentes sobre a falta de um nome para o novo clube. “Os senhores confiaram na ideia e aprovaram a indicação do primeiro presidente, mas não temos nem o nome definido. Como este clube seguirá os princípios democráticos, deixarei que deem suas sugestões. O espaço está aberto”, provocou.

Diversos nomes foram falados: África, Brasil, Concórdia, mas não agradaram e acabaram rejeitados. Dar nome para um clube parecia tão difícil quanto escolher o nome de um filho.

Foi quando Edmundo Jorge de Araújo, filho do conceituado Sóter de Araújo, teve a atenção voltada para si.

“Senhores! Vivemos em Santos. É a nossa cidade. Esse time vai representar a nossa gente, a nossa terra. Por que não Santos? Santos Foot-ball Club?”

Edmundo causou um burburinho. Do outro lado, Raymundo parecia convencido. “Vou colocar em votação”. As palmas se espalharam pelo ambiente.

Estava fundado o Santos Foot-ball Club.

No dia seguinte Harold acordou mais animado para uma segunda-feira. O futebol renascia na sua vida. Saiu para o trabalho e parou na mesma loja de revistas e jornais. Comprou os diários da cidade.

Quando chegou ao trabalho, abriu o jornal A Tribuna. A seção de esportes era o que mais lhe interessava naquele momento. Estava lá:

Santos Football Club com o nome supra acaba de ser fundado nesta cidade, um clube de football destinado, por certo, a uma vida longa e plena de vitórias, para o que conta com os melhores elementos desta terra. Eis a sua primeira diretoria: Presidente, Sizino Patusca; Vice, George P. Cox; 1º Secretário, José Guilherme Martins; 2º, Raul Dantas; 1º Tesoureiro, Leonel Silva; 2º, Dario Ferraz da Frota. Diretores: Augusto Bulle, João Carlos de Mello, Henrique Tross, Raymundo Marques, Cícero F. de Lima Junior e Camyro Faeter.

Cores do novo clube: Branco e azul, com um friso amarelo entre as duas cores.

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