Geraldino, o quarto desfalque contra o Milan, hoje faria 80 anos

Por Odir Cunha, do Centro de Memória
Ele saía com a bola pela lateral esquerda quando se postou à sua frente nada menos do que Garrincha, o diabólico anjo de pernas tortas. Então, com a serenidade e a sabedoria do bom alfaiate que foi na juventude, Geraldino tocou a bola entre as pernas da lenda e saiu com ela do outro lado, altivo, superior, como aquele Santos todo que goleou o Botafogo por 4 a 0, no Maracanã, e se classificou para a final da Copa Libertadores de 1963.
Nada se falou sobre esse sublime atrevimento de Geraldino – transmitido, ao vivo, pela televisão –, assim como pouca lembrança parece ter restado de sua carreira, vivida sempre na fímbria entre a glória e o obscurantismo. Será que é porque seu nome lembra, como escrevia Nelson Rodrigues, os torcedores das gerais do Maracanã? Não, não pode ser, pois o futebol de Geraldino era digno da tribuna de honra de qualquer estádio.
Bem, o que importa é que hoje esse mineiro de Raposos, nascido em 11 de janeiro de 1940, completaria 80 anos. E merece ser lembrado.
Costumamos comentar que em 1963, contra o Milan, o Santos jogou sem Pelé, Calvet e Zito nos dois jogos decisivos, mas nos esquecemos que Geraldinho foi mais um titular ausente da decisão do Mundial. Ele jogou a primeira partida, em Milão e vinha sendo escalado por Lula na lateral esquerda, mas se machucou e assistiu aos dois jogos finais pela televisão, em Santos.
Quase ninguém deve saber que sua contratação pelo Santos, em 27 de abril de 1963, foi anunciada pelo jornal Estado de Minas como “A maior transação do futebol mineiro”. O Santos pagou 30 milhões de cruzeiros por aquele que era chamado de “o mais completo lateral-esquerdo da atualidade”.
Em sua primeira profissão, o jovem Geraldo Antônio Martins trabalhava em uma alfaiataria de Raposos. Mas sabia costurar melhorar no futebol e em 1957, aos 17 anos, iniciou a carreira na equipe profissional do Vila Nova, pelo qual fez 91 jogos e marcou cinco gols.
Em janeiro de 1961 teve uma rápida passagem pelo Siderúrgica, um time forte, patrocinado pela Siderúrgica Belgo-Mineira, que seria campeão estadual em 1964. Mas em junho já estava no Cruzeiro.
Como o titular da lateral-esquerda era o popular Amauri de Castro, o versátil Geraldino atuou como zagueiro ou volante no campeonato de 1961 que deu ao Cruzeiro o tricampeonato estadual. Dois anos depois, já como titular absoluto da lateral esquerda, teve a sua melhor temporada.
Em janeiro de 1963 foi campeão brasileiro pela Seleção de Minas Gerais. Em março do mesmo ano defendeu a Seleção Brasileira no Sul-americano da Bolívia. No mês seguinte, o Santos ganhou a disputa com Vasco e Botafogo e conseguiu contratá-lo.
As negociações se estenderam por um mês. Em princípio, o dirigente Nicolau Moran, do Santos, queria fechar o negócio por 25 milhões, mas Felício Brandi, dirigente do Cruzeiro, insistiu nos 30.
O cobiçado lateral foi levado ao Santos pelo vice-presidente do time mineiro, Adil de Oliveira, que voltou para Belo Horizonte com o cheque no valor combinado. Geraldino fez 70 jogos e marcou um gol pelo Cruzeiro.
Sua categoria e visão de jogo acrescentaram um pouco mais de classe à defesa do Santos. A linha defensiva que ganhou o Torneio Internacional de Buenos Aires, em 1965, e que foi cantada em prosa e verso pela crônica argentina, era formada por Gylmar, Carlos Alberto Torres, Mauro Ramos de Oliveira, Orlando Peçanha e Geraldino.
Mas o jovem lateral também sabia jogar duro e enfrentar os adversários mais apelativos, como mostrou em La Bombonera, na decisão da Copa Libertadores de 1963.
No Santos, Geraldino conquistou o Mundial Interclubes e a Copa Libertadores de 1963, os Campeonatos Brasileiros de 1963, 1964 e 1965, os Paulistas de 1964, 1965, 1967 e 1968 e os Torneios Rio-São Paulo de 1964 e 1966. Fez 214 partidas com a sagrada camisa alvinegra e marcou dois gols.
Ao deixar o Alvinegro Praiano, em 1968, Geraldino ainda jogou dois anos pela Portuguesa de Desportos, encerrando a carreira em 1970. Como tantos outros jogadores que sentiram a emoção de defender o Santos, Geraldino optou por viver o resto de sua vida na cidade de sol permanente, praias calmas, jardins exuberantes e com o maior números de craques por metro quadrado do planeta. Faleceu em 30 de março de 2018, aos 78 anos.

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