Por Guilherme Guarche, do Centro de Memória
A primeira vitória do Santos no Campeonato Paulista ocorreu justamente no primeiro clássico de São Paulo, em um domingo, 22 de junho de 1913. O mau tempo e a chuva intermitente não impediu que um bom público comparecesse às arquibancadas do Parque Antarctica para ver o duelo entre os alvinegros Santos Foot Ball Club e Sport Club Corinthians Paulista, que pela primeira vez participavam do campeonato estadual.
O Santos já tinha estreado, em 1º de junho, e sofrido uma goleada estrepitosa para o Germânia, atual Pinheiros, por 8 a 1. O técnico Urbano Caldeira decidiu então fazer modificações no time que, três semanas depois, subiu a serra para enfrentar o Corinthians, oriundo da várzea paulistana. O resultado não poderia ter sido melhor.
Com dois gols de Adolpho Millon, dois de Arnaldo Silveira, um de Ambrósio e um de Ricardo, o goleou o Corinthians por 6 a 3. Nesse dia, o Alvinegro Praiano jogou com Duval Damasceno, Arantes e Sidney; Pereira, Ambrósio e Ricardo; Millon, Nilo, Urbano Caldeira, Haroldo Cross e Arnaldo Silveira.
Como os minguados cofres do clube dependiam apenas das mensalidades pagas pelos associados, a delegação do Santos, sem verba para as passagens de trem e os lanches na capital, desistiu do certame depois de mais dois jogos. A única vitória santista nesse campeonato promovido pela Liga Paulista de Futebol foi mesmo a goleada sobre aquele que se tornaria um de seus maiores rivais.
Um diário da capital saudou a vitória do time das praias com entusiasmo: A segurança do passe e o esplendido jogo de combinações desenvolvido pela brava rapaziada santista era patente desde o inicio do jogo…”. Com essa boa meia duzia de goals, voltou o team para Santos!
Também empolgado com a reação de seu time, Urbano Caldeira escreveu uma análise que é uma das pioneiras a fazer referências à técnica e à tática no futebol brasileiro e mostra bem a influência do idioma inglês no esporte que já contagiava o País:
Devido ao insucesso do primeiro match, fiz algumas alterações no team, que penso terem dado resultado; a supressão do goal-keeper; pondo um half no in-side-left da linha de forwards; collocando o in-side-right em out-side-right; fazendo um dos backs jogar half-back-right; e, aproveitando para half-back dois elementos do segundo team de onde veio também o goal keeper.
Com essas modificações notei logo no começo do jogo que as forças estavam mais equilibradas e devido a uns trainnings que fiz antes e principalmente pelo excellente jogo dos passes desenvolvido pelos forwards e pela esplendida combinação geral – auxiliada muito fortemente pelos halves dos quais destaco o center-half que jogou magistralmente, sendo a meu ver a alma do team – penso que foi o que contribuiu para a esplendida victoria do dia, sendo que o sucesso foi muito bem recebido em S. Paulo, tendo conseguido desfazer a má impressão do primeiro match.
Não ha nada como um grande perigo para reunir dois contendores – o joguinho pernicioso de driblings (apezar de um forward ter feito muito “bonito”) foi abandonado e a segurança do jogo de passes da linha era tal, que parecia linha de profissionais.
Interessante Urbano falar em jogadores “profissionais” em 1913. Bem, essa informação fica para outras pesquisas. O importante é mesmo a preciosidade deste documento histórico, preservado com carinho no Centro de Memória do Santos Futebol Clube.