Pepe faz 85 anos!

Por Gabriel Santana, do Centro de Memória
O ano de 1935 reservou ao Santos dois grandes acontecimentos: o nascimento de José Macia, o nosso eterno ídolo Pepe, e a conquista do primeiro título paulista.
Quando o time santista levantou o troféu de Campeão Paulista pela primeira vez, em 17 de novembro, o bebê José Macia, nascido na cidade de Santos no dia 25 de fevereiro, tinha apenas oito meses e 23 dias de vida, e não imaginava que seria um dos responsáveis pela próxima conquista estadual do Peixe.
O melhor ponta-esquerda da história santista veio ao mundo em uma segunda-feira de Carnaval, em sua própria residência, na rua João Pessoa, 255, às 20 horas, no Centro de Santos – mesma rua, na época chamada de Rua do Rosário, em que o Alvinegro da Vila tinha sido fundado 23 anos antes.
O nosso ídolo recebeu o nome do pai, José Macia, porém era para ser registrado como José Macia Filho, mas por um erro ficou com o nome exatamente igual ao do pai. A família era originária da Espanha e lá José é conhecido como “Pepe”. Seu pai era chamado assim, e na infância nosso craque era tratado de Pepinho. Ao passar dos anos, ficou conhecido também pelo apelido do pai.
O início no futebol
Aos sete anos de idade, em 1942, Pepinho se mudou com a família para a cidade vizinha de São Vicente. Com seu irmão, Mário, começou a praticar futebol nas equipes do bairro onde morava, o Comercial FC e o Mota Lima. E foi nesse período em que seu pé esquerdo começou a se destacar.
Aos 16 anos Pepe jogava no infantil do São Vicente AC quando Cobrinha, o goleiro do time, que também defendia o infantil do Santos, o convidou para realizar um teste no Alvinegro. No dia 4 de maio de 1951 Pepe pisou pela primeira vez no gramado de Vila Belmiro, e foi aprovado pelo técnico Salu.
Entre os anos de 1952 e 1953 Pepe já estava sob o comando do treinador Lula, nos juvenis do Peixe. E em 1954, aos 19 anos, teve sua primeira chance na equipe principal.

A bombástica carreira
Estreou no dia 23 de maio, em partida diante do Fluminense, no Pacaembu, pelo Torneio Rio-São Paulo. A equipe santista perdeu por 2 a 1, e Pepe entrou no segundo tempo no lugar de Boca, que já havia entrado no lugar de Del Vecchio.
Seu primeiro grande momento como atleta profissional foi no Campeonato Paulista de 1955. Na última partida do certame, Pepe marcou o gol do triunfo diante do Taubaté, na Vila Belmiro, e com a vitória o Santos sagrou-se Campeão Paulista pela segunda vez, exatamente 20 anos depois do nascimento do seu jovem ponta-esquerda.
A essa altura, a potência de sua perna esquerda já era conhecida, e por isso ganhou o apelido de Canhão da Vila. Gols de faltas e pênaltis se tornaram frequentes. E em três ocasiões a sua canhota também proporcionou gols olímpicos.
No juvenil, variava sua posição entre a meia-esquerda e a ponta-esquerda, mas no profissional decidiu-se pela ponta-esquerda e tomou conta da posição por anos a fio.
Dentre as partidas marcantes em sua carreira, Pepe gosta de destacar a segunda do Mundial Interclubes de 1963, diante do Milan, no Maracanã. No primeiro jogo, em Milão, o Santos perdeu por 4 a 2. No segundo, perdia por 2 a 0 ao fim do primeiro tempo e perderia o título naquela noite se não conseguisse a virada. Mas o Alvinegro voltou determinado na segunda etapa e virou para 4 a 2, devolvendo o placar da primeira partida. O Canhão da Vila marcou dois gols, ambos de perna esquerda, cobrando falta.
Na terceira e decisiva partida do Mundial, novamente no Maracanã, o Peixe venceu por 1 a 0, com gol de pênalti do lateral Dalmo. Como Pelé estava fora da partida por contusão, Pepe seria o encarregado de executar a cobrança, mas ao ver a confiança de Dalmo, que havia pedido para cobrar, Pepe não pensou duas vezes e cedeu a cobrança ao companheiro de equipe.
Um ano antes, em Lisboa, o Santos havia se tornado campeão mundial pela primeira vez ao golear o Benfica, bicampeão europeu. Pepe considera essa partida a melhor apresentação da história do Santos. O Peixe venceu por 5 a 2 a equipe de Eusébio, em pleno Estádio da Luz. Pelé marcou três vezes e Coutinho e Pepe marcaram um gol cada.
Como atleta do Santos, Pepe conquistou 25 títulos oficiais, sendo 11 Campeonatos Paulistas, seis Campeonatos Brasileiros, duas Taças Libertadores da América, dois Mundiais Interclubes e quatro Torneios Rio-São Paulo, tornando-se o jogador com mais títulos por um único clube. E isso sem contar os inúmeros torneios conquistados pelo mundo.
Maior vencedor de Campeonatos Paulistas, com 13 títulos conquistados (11 como jogador do Santos, um como técnico do Santos e um como técnico da Internacional de Limeira), o Canhão da Vila é também o maior vencedor de Campeonatos Brasileiros, com sete títulos conquistados – seis como jogador do Santos e um como técnico do São Paulo.
Disciplinado ao extremo, e mesmo às vezes caçado em campo por marcadores violentos e maldosos, Pepe jamais foi expulso de campo, e por essa rara disciplina recebeu o troféu Belfort Duarte.
Constante, foi titular absoluto da ponta-esquerda santista até 1965, quando chegou aos 30 anos. A partir dessa data, até 1969, ano em que encerrou a carreira, passou a revezar a titularidade com o jovem Abel, contratado do América do Rio de Janeiro, e, desde 1966, com Edu, oriundo das categorias de base do Santos.
Um dos raros exemplos de jogador que fez toda a carreira em um único time, Pepe dedicou 15 anos de sua vida à equipe profissional do Santos, chegando a recusar propostas milionárias da Europa apenas para continuar no seu clube de coração. Se somarmos desde seu primeiro ano como juvenil, até o último como profissional, foram 18 anos como atleta do Santos.
Seleção Brasileira
Pelo seu bom desempenho no Santos, era chamado regularmente para defender a Seleção Brasileira. Sua primeira oportunidade com a “amarelinha”, ocorreu no dia oito de julho de 1956, quando o Brasil enfrentou a Argentina pela Taça Atlântico e empatou em 0 a 0.
Convocado para as Copas do Mundo de 1958, na Suécia, e 1962, no Chile, se machucou nas vésperas das duas Copas e não pôde atuar em nenhuma partida nesses dois primeiros títulos mundiais da Seleção Brasileira. Mesmo machucado, porém, participou do grupo campeão. Ao todo, realizou 40 jogos pela Seleção Brasileira e marcou 22 gols, com média de 0,55 gols por partida.

Despedida, na Vila
Em 3 de maio de 1969, diante de um público de 22 810 espectadores, o eterno Menino da Vila deu adeus à carreira de jogador ao se despedir do torcedor santista com uma volta olímpica no gramado de Vila Belmiro antes da partida entre Santos e Palmeiras, vencida pelo visitante por 1 a 0.
Nesse dia histórico, em que se despediu da torcida sem atuar, Pepe foi homenageado pela diretoria santista ao receber do presidente Athié Jorge Coury uma placa alusiva à sua passagem pelo clube que defendeu em 741 partidas e pelo qual marcou 403 gols no período de 1954 a 1969. Na placa estava escrito: “Muito obrigado do Santos, da torcida e de todos os esportistas do Brasil”.
Técnico vitorioso
Após se aposentar dos campos, Pepe foi trabalhar nas categorias de base do Alvinegro. Pouco tempo depois foi promovido a auxiliar técnico da equipe principal, e em 1972 assumiu o comando técnico da equipe principal pela primeira vez. Em 1973 dirigiu a grande equipe que conquistou o título paulista, o seu primeiro como treinador e o último da carreira do Rei Pelé.
Como treinador, teve cinco passagens pelo Santos. Dirigiu o Alvinegro em 371 partidas, sendo o terceiro técnico que mais comandou a equipe praiana. Também dirigiu outros clubes: Inter de Limeira, São Paulo, Guarani, Portuguesa, Ponte Preta, Portuguesa Santista, Atlético do Paraná, Verdy Kawazaki, Seleção Peruana, entre outros.
Quando treinou o Al-Ahli, do Catar, entre 2003 e 2005, Pepe orientou o espanhol Josep (Pep) Guardiola. A visão tática de Guardiola e seu interesse pela história do Santos bicampeão mundial de 1962/63 deixaram em José Macia a certeza de que rapaz se tornaria um ótimo técnico e adepto do futebol ofensivo.
Além do Paulista de 1973, os títulos mais importantes de Pepe foram o Campeonato Brasileiro de 1986, pelo São Paulo e, no mesmo ano, o Campeonato Paulista pela Internacional de Limeira.
Frases marcantes
Com 403 gols, Pepe é o segundo maior artilheiro da história do Santos, ficando atrás apenas do Rei Pelé. Mas, como ele sempre diz, é o maior artilheiro humano do Peixe: “Eu sou o maior artilheiro da história do Santos, porque o Rei não conta, ele é de outro mundo.”
“1 a 0, gol de Sanfilippo, aquela galera toda, estádio quase vindo abaixo, campo ruim, adversário forte, que dava pancada, que sabia jogar, tudo contra, só que tinha uma coisa… era o Santos que estava do outro lado”.
Essa frase acima foi dita em uma entrevista, referindo-se ao segundo jogo da final da Libertadores de 1963, diante do Boca Juniors. A equipe santista saiu perdendo por 1 a 0 no Estádio La Bombonera, mas virou para 2 a 1, com gols de Coutinho e Pelé, e conquistou seu segundo título continental.
Sua história em livros
Se já não bastasse tudo que Pepe fez pelo futebol, em 2012 ainda lançou um livro de memórias, com o título “Bombas de Alegria, meio século de memórias do Canhão da Vila”, no qual conta histórias curiosas do futebol. Sua biografia foi lançada em 2015, escrita por Gisa Macia, sua filha, formada em jornalismo.

Sempre presente
Hoje ele completa 85 anos de idade, e quem tiver a chance e a honra de conversar um pouco com o “seo Pepe”, não desperdice. Conversar com ele é como conviver com a memória viva do Santos. Ver seu sorriso no rosto ao final de cada história é gratificante. E quem não tiver o prazer de falar com ele ou ouvir suas histórias pessoalmente, ainda poderá vê-lo no Youtube. Auxiliado por sua filha Gisa, recentemente Pepe criou um canal para contar suas histórias no futebol. O canal se chama “Canal Pepe 11”.
José Macia será eternamente um dos maiores atletas que já envergaram, com maestria, determinação e elegância, a camisa santista. Lembrar de Pepe é lembrar do Santos, e lembrar do Santos é lembrar de Pepe.

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