Gabriel Pierin, do Centro de Memória
Sob um céu aberto, no domingo 19 de dezembro de 2004, o Santos confirmou a conquista do Campeonato Brasileiro ao derrotar o Vasco da Gama por 2 a 1 no Estádio Benedito Teixeira, em São José do Rio Preto. O resultado assegurou ao Alvinegro Praiano o oitavo título nacional de sua história e marcou sua única conquista no formato de pontos corridos.
A campanha santista até o título foi tudo menos tranquila. O clube enfrentou uma série de obstáculos dentro e fora das quatro linhas, especialmente nas rodadas finais da competição. Uma decisão inédita e severa do então presidente do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, Luiz Zveiter, puniu o Santos pelos incidentes ocorridos na Vila Belmiro, proibindo o time de atuar no Urbano Caldeira e em qualquer estádio situado a menos de 150 quilômetros de sua sede.
Longe de se abalar, a equipe respondeu em campo. Empurrado por torcedores do interior paulista, o Santos venceu todas as partidas realizadas fora de sua casa tradicional. Em Mogi Mirim, superou o Figueirense por 4 a 1. Em São José do Rio Preto, aplicou goleadas sobre Fluminense (5 a 0) e Grêmio (5 a 1). Entre esses compromissos, em Presidente Prudente, buscou a virada contra o Goiás e venceu por 2 a 1.
O desempenho consistente em São José do Rio Preto — cidade localizada a 442 quilômetros da capital paulista — deu ao Santos a tranquilidade de chegar à rodada final precisando apenas de um empate diante do Vasco para levantar a taça.
A trajetória poderia ter sido menos tortuosa não fossem os inúmeros erros de arbitragem ao longo do campeonato. Ao todo, deixaram de ser assinalados seis pênaltis a favor do Santos, além da anulação de nove gols válidos, sete deles marcados pelo artilheiro Deivid.
Fora das quatro linhas, outro episódio marcou profundamente a campanha. A mãe de Robinho, principal nome do elenco, foi vítima de sequestro, fato que ganhou repercussão nacional e afastou o atacante por seis rodadas. Seu retorno ocorreu somente na última partida, justamente na decisão contra o Vasco.
O elenco também passou por profundas transformações. A base campeã brasileira de 2002 e vice-campeã da Libertadores e do Brasileiro em 2003 foi desmontada. Nomes importantes como Fábio Costa, Alex, Renato e Diego já não faziam parte do grupo. O técnico Emerson Leão, responsável pelo trabalho anterior, acabou demitido no início da competição após três derrotas nos quatro primeiros jogos.
A reconstrução sob o comando de Luxemburgo
Vanderlei Luxemburgo assumiu o comando da equipe no começo de maio. O início foi instável: duas derrotas e um empate empurraram o Santos para as últimas posições da tabela, chegando ao 20º lugar, muito próximo da zona de rebaixamento — cenário agravado pelo fato de o campeonato contar com 24 clubes.
A reação veio em seguida, com uma sequência decisiva de vitórias que recolocou o time na briga pelo título. O Santos venceu o Vitória em Salvador (2 a 1), derrotou o Internacional na Vila Belmiro (3 a 0), superou o Guarani no Pacaembu (2 a 1), bateu o Corinthians também no Pacaembu (3 a 2), goleou a Ponte Preta em Campinas (4 a 0), venceu o São Paulo na Vila Belmiro (2 a 1) e superou o Flamengo, novamente em casa, por 2 a 0.
Mesmo alternando bons e maus momentos, o time permaneceu na disputa pela liderança até alcançá-la na penúltima rodada. Na ocasião, o Santos venceu o São Caetano por 3 a 0 no Estádio Anacleto Campanella, enquanto o então líder Atlético Paranaense foi derrotado pelo Vasco por 1 a 0, em São Januário.
Ainda com chances matemáticas, o clube paranaense chegou à rodada final precisando vencer o Botafogo e torcer por um tropeço santista. Nenhuma dessas condições se confirmou.
No dia decisivo, o Teixeirão recebeu 36.426 pagantes que testemunharam a consagração santista. O placar começou a ser construído logo aos cinco minutos, quando Ricardinho cobrou falta com precisão. Aos 30, Elano ampliou ao cabecear cruzamento de Preto Casagrande.
No segundo tempo, Robinho driblou o goleiro e balançou as redes para fazer 3 a 0, mas o árbitro Leonardo Gaciba anulou mais um gol legítimo do Santos naquela edição do campeonato. Aos 16 minutos, Marco Brito descontou para o Vasco, mas o placar permaneceu inalterado até o apito final.
Com 89 pontos conquistados e 27 vitórias — três pontos e dois triunfos a mais do que o Atlético Paranaense — o Santos confirmou a superação de todos os obstáculos para inscrever o oitavo título brasileiro em sua galeria.
Na partida decisiva, Luxemburgo escalou o Santos com Mauro; Flávio, Ávalos, Leonardo e Léo; Fabinho, Preto Casagrande, Ricardinho e Elano (Marcinho); Robinho (Basílio) e Deivid (Willian). O Vasco, dirigido por Joel Santana, atuou com Everton; Henrique, Fabiano (Gomes), Daniel e Claudemir; Coutinho, Ygor, Junior (Rubens) e Rodrigo Souto (Rafael); Diego e Marco Brito.
Marcas históricas
A conquista de 2004 consolidou um ciclo vitorioso do clube, que somou dois títulos brasileiros e um vice-campeonato em três temporadas. O Santos também estabeleceu o recorde de gols em uma edição do Campeonato Brasileiro, com 103 tentos — marca ainda não superada. Para Vanderlei Luxemburgo, o título representou o quinto campeonato nacional da carreira, igualando a marca histórica de Lula, pentacampeão pelo Santos entre 1961 e 1965.