Rei Pelé – 1.091 gols pelo Santos FC

Texto de Fernando Ribeiro
Associação dos Pesquisadores e Historiadores do Santos FC (Assophis)
Nos últimos dias muito se comentou na imprensa e nas redes sociais sobre a quantidade de gols marcados por Pelé com a camisa do Santos Futebol Clube. De acordo com alguns estatísticos, o argentino Lionel Messi (Barcelona) se tornou o jogador com mais gols por um mesmo clube, ao atingir 644 gols pelo clube catalão, excluindo-se partidas amistosas – chamado por alguns como gols oficiais.
Pelé já havia parabenizado o camisa 10 do Barcelona, “Histórias como a nossa, de amor ao mesmo clube por tanto tempo, infelizmente serão cada vez mais raras no futebol”, escreveu o Rei em suas redes sociais. No entanto, parte da imprensa noticia o feito histórico renegando o maior de todos os recordes, os gols totais nos clubes. Pelé marcou 1.091 gols pelo Santos. Nas contas da imprensa especializada, o Rei do Futebol marcou 643 em competições e os 448 gols anotados em partidas e competições amistosas foram relegados ao ostracismo, como se tivessem menos valor do que os demais.
Os 448 gols que hoje tentam desqualificar, foram marcados contra os principais clubes e seleções da época. América (México) e Colo Colo (Chile) sofreram, cada um, nove gols de Pelé. A Internazionale de Milão, uma das principais equipes da Europa na década de 60, sofreu outros oito tentos do Rei. A lista é imensa e com participantes de peso: River Plate, Boca Juniors, Racing, Universidad de Chile, Real Madrid, Juventus, Lazio, Napoli, Benfica e Anderlecht. O próprio Barcelona, onde hoje atua Messi, também foi vítima de Pelé: foram quatro gols, marcados em quatro partidas.
O argumento de alguns analistas é que outros tantos destes 448 gols marcados em disputas amistosas foram diante de adversários frágeis, como seleções de pequeno porte ou combinados regionais. Ainda assim, as partidas foram disputadas com uniformes oficiais, com as regras oficiais do jogo e com súmula. Temos que lembrar que os clubes só podiam disputar amistosos com aval das federações regionais e nacionais, uma das regras impostas pela FIFA, a organizadora do futebol mundial. Levar em consideração atributos subjetivos, como fragilidade de adversários, não é o ideal para compilar dados estatísticos. Os números são absolutos. Um gol diante do Eibar vale o mesmo, estatisticamente, do que o marcado diante do Valência. Um gol diante do Transvaal (do Suriname) possui o mesmo valor de um anotado no Real Madrid, em pleno Santiago Bernabéu. Inclusive esta separação de gols “oficiais” é fato recente, afinal publicações de clubes europeus e atletas contabilizam as partidas amistosas em suas estatísticas.
Uma pequena mostra de como o recorte estatístico pode nos induzir ao erro, é quando analisamos os títulos do Campeonato Paulista. Quando consideramos apenas a era do profissionalismo no futebol de São Paulo (a partir de 1933), o Santos torna-se o maior campeão estadual, com 22 conquistas – ao lado do Corinthians. Supera assim o Palmeiras, que fica com 19. Ainda assim, o revisionismo histórico não pode apagar a história: os títulos da era amadora são válidos, com importância igual aos conquistados após a implantação do profissionalismo. Assim, o Santos possui 22 conquistas, contra 30 do Corinthians e 23 do Palmeiras.
Outro ponto que deve ser considerado e contextualizado, é a estrutura dos jogos que hoje são chamados oficiais. O primeiro torneio nacional de clubes, a Taça Brasil, começa a ser disputado em 1959. O principal campeonato, o Paulista, era disputado entre os meses de julho e dezembro, com o extinto Torneio Rio-São Paulo ocupando uma pequena parte do primeiro semestre – cerca de dois meses. Assim, os clubes aproveitavam o amplo período sem competições, para disputas amistosas e excursões.
Com a valorização do futebol brasileiro, após a conquista da Copa do Mundo em 1958, os amistosos passaram a ser a fonte de receita para manutenção dos principais jogadores por aqui. Mesmo com intenso assédio dos grandes clubes europeus, craques como Pelé, Pepe, Zito e Coutinho permaneceram jogando no Santos. O alvinegro praiano passou mais de 1000 dias excursionando pelo planeta – que dá um pouco mais de dois anos fora de casa. Chegou até ao ponto de ignorar a disputa da Copa Libertadores no ano de 1967, mesmo tendo obtido a vaga como vice-campeão brasileiro do ano anterior.
Além disso, a estrutura do futebol de seleções da época era outra. Sem as chamadas “datas FIFA”, os clubes cediam seus atletas por longos períodos para preparação visando a Copa do Mundo. Pelé ficou sem jogar pelo Santos por mais de dois meses nos anos de 1962, 1966, 1969 e 1970, servindo ao escrete canarinho.

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