A chegada do Rei ao Santos

Dona Celeste não queria que o filho jogasse futebol. Mas Pelé, aos 15 anos, já era bem conhecido em Bauru, prova é que Elba de Pádua Lima, o Tim, técnico do Bangu, tentou levar o garoto para o Rio de Janeiro. Dona Celeste disse não.
Mas com Waldemar de Brito foi diferente. O ex-futebolista era amigo de Dondinho e técnico de Pelé no time infantil do Bauru Atlético Clube, o Baquinho. Não houve como recusar o pedido de levar Pelé para treinar no time amador do Santos e dona Celeste consentiu a ida dele para Santos.
Waldemar prometeu ao deputado estadual e presidente do Santos, Athié Jorge Coury, que caso ele conseguisse uma transferência da cidade de Bauru para a capital paulista, na função de funcionário público na mesma área em que ele trabalhava, ele entregaria um jovem que jogava no time que ele treinava e que seria o melhor jogador do mundo.
Athié, um velho conhecido de Waldemar, ouviu atentamente a solicitação do técnico do Bauru AC e prometeu ajudá-lo na empreitada, pois ficara entusiasmado com os comentários feitos por ele sobre a joia que tinha em suas mãos.
E assim foi feito. Athié esperou a melhor oportunidade de pedir o favor ao então governador de todos os paulistas, o polêmico e controverso político que governou São Paulo entre os anos de 1955 e 1959, e que em 1961 se elegeria Presidente do Brasil, Jânio Quadros.
E foi durante um almoço no Ilha Porchat Clube, em São Vicente, que Athié muito astutamente esperou o melhor momento para pedir que Jânio Quadros assinasse o documento que autorizava a transferência de Waldemar para trabalhar em São Paulo, tudo após muita conversa e animação nas dependências do clube calunga.
Transferência concretizada e Waldemar, satisfeito em poder trabalhar na capital, acertou a ida de Pelé para Santos e assim começa a trajetória do futuro Rei do Futebol no Alvinegro Praiano.
Pelé tinha apenas 15 anos quando deixou Bauru. O menino do interior sentiu um nó na garganta ao se despedir da mãe, dona Celeste, e do irmão, Zoca. Envolvido pela ansiedade, não conseguiu dormir na longa viagem em companhia do pai até São Paulo.
No dia 21 de julho de 1956, um sábado, Pelé e seu pai, Dondinho, embarcaram no trem da Companhia Paulista de Estradas de Ferro para encontrar Waldemar na Estação da Luz, em São Paulo. Os três pernoitaram em um hotel nas proximidades da estação.
No dia seguinte pegaram um ônibus do Expresso Brasileiro e foram ao litoral. Essa viagem mudou para sempre o Santos e o futebol mundial. Era 22 de julho de 1956. um dia que jamais será esquecido pelos torcedores santistas, pois nesse distante dia, Pelé adentraria pela primeira vez no Estádio Urbano Caldeira.
A paisagem da Via Anchieta se revelou deslumbrante para o garoto que nunca tinha visto o mar. Na viagem ele ouviu conselhos do pai e do ex-técnico. Pediam para que não bebesse, não fumasse e não se metesse com mulheres. Ele ouvia tudo atentamente, sem tirar os olhos do cartão postal que se descortinava para além das curvas da estrada.
Desembarcaram em Santos e foram direto para a Vila Belmiro. O Santos enfrentava o São Bento de São Caetano do Sul pela quinta rodada da fase de classificação do Campeonato Paulista. Waldemar providenciou para que a mala de Pelé fosse para a concentração dos jogadores, no estádio, e conseguiu bons lugares para Dondinho e Pelé assistirem ao jogo.
Pelé diz que, quando percebeu, já estava torcendo para o Santos, assim como os outros 5 300 torcedores presentes no Urbano Caldeira. O ambiente era alegre e Waldemar levou Pelé ao vestiário para ser apresentado ao técnico e aos jogadores.
O técnico Lula cumprimentou a jovem promessa: “Então é você o tal Pelé, heim?!”. O garoto ficou sem jeito e foi apresentado para o ídolo da torcida e dono da camisa 10 que um dia seria eternizada pelo recém-chegado.
Dondinho disse que Pelé ficaria na Vila e pediu para Vasconcelos tomar conta dele. Vasco, como o chamavam, gostava da farra, mas levou a sério a incumbência paterna e jamais permitiria que Pelé bebesse ou fumasse. Pelé se sentiu à vontade em meio aos craques que ele só conhecia por figurinhas.
Contratou o Santos um moço que promete ser um crack
Logo após seu primeiro treino, Pelé foi assunto de reportagem do jornalista Adriano Neiva, o De Vaney, publicada na edição 25 de julho de 1956. Dizia De Vaney que no treino de 40 minutos “destacou-se sobremaneira o meia-direita que formou no time dos suplentes, com um trabalho sóbrio, porém de boas qualidades técnicas”.
Após o treino, ainda segundo De Vaney, o departamento profissional do clube entrou em entendimentos com pai do jogador, João Ramos do Nascimento, o Dondinho, e Waldemar de Brito, “o famoso jogador do passado, que é o orientador intelectual da grande promessa futebolística”, e acertou-se que o jovem Edson Arantes do Nascimento receberia seis mil cruzeiros mensais (o equivalente a dois salários mínimos da época) e ganharia uma bolsa de estudos do Santos Futebol Clube para cursar o ginásio em um colégio da cidade.
 

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